Há 21 anos as questões de crianças e adolescentes eram um problema exclusivo dos pais. O Estado só lidava com meninos e meninas quando tinha que puni-los por algum desvio, normalmente restringindo sua liberdade e os afastando da família. A Lei que regia nossa infância era chamada de Código dos Menores e não garantia nenhum direito aos nossos pequenos cidadãos. Mas o Estatuto da Criança e do Adolescente mudou, e muito, esse conceito.
Diversos movimentos sociais que queriam trazer um novo olhar sobre a infância se envolveram no processo de redação do Estatuto. A votação do texto, inclusive, contou com a participação de crianças e adolescentes que disseram sim à legislação em um voto simbólico que ocorreu na Câmara Federal. Como resultado desse esforço coletivo temos hoje o que a Promotora de Justiça Cível e de Defesa dos Direitos Individuais, Difusos e Coletivos da Infância e Juventude Fabiana Assis chama de "uma lei de vanguarda".
Ela acredita que a grande contribuição da Lei aconteceu no nível simbólico. "A expressão 'sujeito de direitos' trouxe mudanças não só na elaboração de políticas públicas mas na visão que a sociedade tem sobre a infância", diz. Isso porque esta estabelece proteção integral a indivíduos em formação e prioridade absoluta por parte do poder público, da família e da comunidade em geral na garantia de direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
O Promotor de Justiça de Execuções de Medidas Socioeducativas, também da Infância e da Juventude, Anderson Pereira admite que existem críticas contra o Estatuto, porém sua validade está acima dos eventuais problemas. "É uma lei humana, imperfeita por definição como qualquer outra, mas se fosse cumprida como está apresentaria um alto índice de ressocialização de adolescentes". O colega, Marcio Almeida, Promotor de Justiça Infracional da Infância e da Juventude, completa: "essa legislação trouxe muitos avanços, isso é uma opinião generalizada. Mas acho que o déficit de desenvolvimento na área da infância está na sua falta de implementação por parte do governo, o que é uma pena".
Segundo Anderson, o Distrito Federal apresenta problemas intensos na área em que atua. "As medidas socioeducativas são o calcanhar de aquiles da Lei, porque as regras que estabelece não são cumpridas. Temos superlotação no Caje e um índice de mortes muito alto nas internações", conta. Ele explica que alguns direitos assegurados nunca foram tirados do papel, como o estabelecimento de limites para a restrição da liberdade de adolescentes infratores, que para o Promotor é o maior avanço que o texto trouxe. "Alguns lugares do país já apresentam bons resultados na reintegração de jovens, mas nosso governo não possui políticas públicas para aproveitar o potencial ressocializador dessa Lei".
E como garantir esses direitos, efetivar, fazer valer o Estatuto da Criança e do Adolescente? Fabiana explica que na esfera do Judiciário deve-se dar voz e a oportunidade de se manifestar a esses sujeitos em tudo que for do seu interesse. Já o Executivo deve compreender que os direitos das crianças são realmente prioridade e demonstrar isso em seus projetos e destinação de recursos. Por fim, o Legislativo deve sempre verificar se o Executivo manteve essa prioridade e zelar por ela em toda atividade de criação e modificação de leis. "O Estatuto precisa passar do texto de uma lei para a prática, estar presente no senso comum e no cotidiano de toda sociedade, enfim, ser uma realidade pra mim, pra você e principalmente para todas nossas crianças e adolescentes", diz.
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